Poesia III (1963-1976)
Vitorino Nemésio
Este é o terceiro volume da série Poesia da Obra Completa de Vitorino Nemésio. Com esta edição, destinada a um público vasto, em que cada volume é revisto e apresentado por um especialista na matéria, a Imprensa Nacional e a editora Companhia das Ilhas dão um contributo decisivo para a divulgação e o conhecimento da obra de um dos escritores que ficarão para a história da literatura portuguesa do século xx: Vitorino Nemésio Com este volume se encerra a reedição, nesta coleção, dos livros de poesia que Vitorino Nemésio foi preparando e publicando ao longo da vida, bem como de poemas que ele publicou dispersamente e que não recolheu em livro. Neste terceiro volume — Poesia (1963-1976), temos os derradeiros livros publicados em vida do Autor: O Cavalo Encantado (1963), Canto de Véspera (1966), Vesperais (1966), Poemas Brasileiros (1972), Limite de Idade (1972) e Sapateia Açoriana, Andamento Holandês e Outros Poemas (1976), e mais sete poemas dispersos, dois deles publicados em 1920 e cinco entre 1959 e 1977
Edição literária de Luiz Fagundes Duarte.
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Excerto
POEMAS ILHÉUS
I
Meus pais tinham a Vinha do Mão Roxa nas lavas
Onde um fumo de faia perfumava a cozinha
E três tàlhões de Santa Maria, em vasos comunicastes,
Recebiam ao longo do beiral as águas bravas
Por dois buracos de telha por onde também vento vinha.
A lareira era esconsa, em abobadilha de barro,
Duas citrinas de oiro, par a par, davam flor,
Recebíamos leite, à tarde, no seu tarro,
E suspeito que tive ali um breve amor.
Que eu tive muitos e numero-os mal,
Cada um, pela força, me parece o primeiro
(Não vou rimar este verso seguinte,
Quem rima chora o dia inteiro).
Olha o mar longe, entre as vinhas, olha a Bela-
-Dona flor dos outonos despedidos;
Estou a ver a tranqueta da janela,
Durmo em memória os sonos lá compridos.
Sou poeta de mais e é um destino duro
Este de arredondar como peras as frases,
Meu coração tornou-se um quarto escuro,
O meu velho baralho está sem ases.
Bem! Basta! Corta o fio à fala louca
Que já para epopeia preparavas:
Esquece as faias, o Mão Roxa! Cala a boca,
Morre às mãos do silêncio sem rima nem fingimento algum de qualquer
Como homem forte que joga longe o coração.
20. Nov. 1977
Nota de leitura