Um espelho para reproduzir as mutações da vida
Fernando Machado Silva
Como todas as antologias, esta é um receptáculo de afectos. O seu título pede emprestado um verso de Fiama, voz poética que soube tão singularmente captar os acontecimentos do mundo.
Por estes versos passa uma vida; por esta razão, poderia o livro chamar-se “hypomnemata”, esses diários impessoais dos Estóicos escritos com o intuito de lhes facultar as ferramentas analíticas para a sua transformação. Se ao lerem os poemas virem um rosto, uma voz, que se muda sendo o mesmo/a mesma, este espelho reflectiu bem as mutações de uma vida.
Excerto
[…]
acolhe-nos a ermida pelo caminho
com frio frugalidade e vento fustigando
e dois cães sedentos de atenção e amor
como tu e eu mais abertamente ou em secreto
silenciado orgulho (talvez esta chamada e anseio
sejam a chave da história humana em todos os seus modos
mesmo no apelo do carpinteiro pelo abandono do pai)
chegámos também nós ao oásis e tratámo-nos como reis
banhámo-nos como nos achámos merecidos em águas quentes
e demos graças aos nossos corpos mergulhados em volúpia.
Nota de leitura