Sombramar
José Manuel Teixeira da Silva
Ilustrações: Ana Abreu
Sombramar. Um diário de férias cruzado, um “puzzle” narrativo. 31 dias de Agosto numa vila de nome impossível, à beira mar. O levantamento topográfico acerca-se de materiais caprichosos, memórias resistentes, estratos de imaginação. Temas graves, ocorrências ao pé de nós. Visibilidade deste mundo e do outro, momentos decisivos, gentrificação, outras palavras que dizemos ou calamos. Se houver sorte, uma história de amor, passeios às grutas e chuvas de estrelas. Irrompe, enfim, uma outra narrativa, por fora e muito por dentro, os desenhos de Ana Abreu. Sombramar.
Excerto
1 de Agosto
Acabei de chegar a Sombramar, sinto-me bem. É como se tudo estivesse disposto a receber-me, as árvores que foram talhadas pelo vento para apontarem o mar e a inclinação natural das ruas que me levou ao bairro dos pescadores. Arrendei uma casa de férias para o mês inteiro. Lá estava ele, o mar. Talvez haja, querido diário, uma estante para a papelada. Percebi que os donos da casa estranharam a bagagem, apenas uma mala de roupa, o portátil, uma mochila com cadernos e livros; e também, é claro, que viesse uma mulher assim sozinha. Problema deles. (…)
*
Cheguei enfim, mas esqueci-me de como se chama esta povoação à beira-mar. Sinto-me perdido, nem sei se estou no centro, se é o sítio em que reservei o hotel. Sentei-me num bar de esquina para tomar um café e acolher esta friagem que cria bronquites (suspeito) a quem vive o ano inteiro nestes confins da terra. É, de facto, uma porção de terra que entra pelo mar, mais uma no meu currículo. “Finis terrae”. Quis vir, mas já não sei se foi boa ideia. (…)
Nota de leitura