Pena de Morte
Jorge Aguiar Oliveira
Poeta de Sião (organização de Al Berto, Paulo da Costa Domingos e Rui Baião, frenesi, 1987), Jorge Aguiar Oliveira (Tondela, 1956), mantém-se na zona da poesia portuguesa de margem (como, aliás, quase todos os poetas dessa marcante antologia). Mas se a marginalidade é o território desta poesia, ela não é «uma bandeira plástica, mas, paradoxalmente, o centro a partir do qual se observa com satírica vocação a normalidade instituída, promovida, estupidamente e “estupidificantemente” acolhida pela maioria» (sublinha o poeta e crítico Henrique Manuel Bento Fialho).
Neste Pena de Morte as imagens poéticas de Jorge Aguiar Oliveira circulam por escombros de guerra, corpos caídos, fronteiras de morte (a nossa e a dos outros), a medicalização da vida, as hipocrisias democráticas. Saber se é possível (e como) ver o mundo, é outro tema forte deste livro: «os vidros das janelas / defronte ao mundo / estão sujos / como sujos estão / os vidros destes olhos» (“Cereus R. & Batracotoxina”). Um livro em que a morte ronda, sempre, mesma a sua: «renascer transplantando / um caco de coração / na terra do vaso / assistindo aflito / ao pulsar sanguinário / da madrugada envenenada» (“Aloe Polyphylla & Zyklon B”).
A poesia de Jorge Aguiar Oliveira não se reduz, porém, aos “temas”, por “fortes” que sejam, longe disso: a energia e a intensidade da sua linguagem, de forte carga erótica, fazem dele uma das mais importantes vozes da poesia portuguesa contemporânea.
Nas Livrarias na segunda quinzena de Fevereiro de 2018.
Excerto
Cereus R. & Batracotoxina
os vidros das janelas
defronte ao mundo
estão sujos
como sujos estão
os vidros destes olhos
um olho, um mundo
um fósforo encadeando
o pulsar da cegueira
as roupas entrega
na esquadra e diz
terem sido dum vulto
que encontraste um dia
numa berma perdida
do destino
no charco, o rosto
diluía-se em contramão
aos beijos, e
o teu nome entupindo
todas as sargetas
Nota de leitura