Palpites para má-língua e sevícias

Narciso Pinto

Novela fragmentada e escaqueirada em mitos, relatos, intrigas, ensaios, diálogos, curtas, boatos, arquivos e cartas, tendo por mote e desígnio o registo de uma era particularmente vizinha da que nos assombra a existência.

O autor não se coíbe de explorar exaustivamente o insólito, o grotesco e a violência que irrompem do quotidiano aparentemente mais comezinho, deixando todo e qualquer protagonista à mercê de si mesmo e da sua sina. Através da lente pícara e obsessiva do autor, que à distância devida observa o desencadeamento natural das tramas, constatamos que a vileza e predileção pela maledicência são forte apanágio de todos os participantes. Será plausível, porém, supor-se que boa parte do enredo seja até encenado. É um palpite.

 

Excerto

espécie de incipit, vulgo prefácio
ei-lo: o vade-mécum que visa (s/ comissão de abertura) a origem do que me faz espécie. compêndio fundamental à compreensão da natureza humana, sob o ponto de vista instruído, ante um cheirinho a vitimização, de um malogrado de gema.
sabendo-me privado do estofo necessário para intelectual e a milhas da finesse-padrão com vista a embuçar-me em tal meio, resta-me em desespero de causa enfarruscar a vulgaridade do ramerrame, e assim como assim, aputalhar sem pudores a literatura e o resto: estratégia decerto mesquinha, não o nego.
lição a reter: todos somos falíveis! e nunca se está suficientemente prevenido para lidar, sem paliativo à escolha, com as agruras da existência. por certo expectável e nada que verdadeiramente nos faça pasmar. posto isto, o vaticínio é simples: todos nós derrocamos, indiscriminadamente, com grau variável de frequência e estrondo ─ convoque-se a Lei de Murphy para atestar o que infiro. todavia, há que ter brio na desdita: ornar o vexame, forrar os estragos, jogar à bravata com o enxovalho íntimo e sair-se ileso da imagem que de nós espelham. o sucesso, convém esclarecer, é um mero ponto-de-vista.
premissa essencial: é opcional ser-se quem se é ─ questão de treino e postura. é um feeling quiçá arrojado, meio sedento d‘ovações. há que seduzir o ego, lerpar expectativas, aviar lérias d’azeitona e palito (opcional), e esplanadar que se farta, à sombra da ociosidade merecida a fim de angariar tais palpites. isto, claro está, sempre cientes da inutilidade de um tamanho empreendimento. e tal ideia não ocorreria a ninguém, por certo, pelo que adiante.!
o meu desígnio literário, salvo o intelectual vandalismo, é mester de toupeira: ao passo que a humanidade se vai devorando à superfície, aqui o bicho vai escarafunchando a sua obra por debaixo da barbárie. volta e meia fareja-se à tona e resgatam-se congéneres ─ quaisquer criaturas que se identifiquem ou sensibilizem, acomodemo-nos: somos, aliás, barra em matéria de conformismo. e dominar o mundo é fazer nada ─ assim debaixo da terra como no céu.

«existe esperança, esperança infinita ─ mas não para nós»

Nota de leitura

Ficha Técnica

ISBN: 978-989-9007-88-8

Dimensões: 14x22cm

Nº páginas: 212

Ano: 2022, Outubro

Edição: # 276

Colecção azulcobalto # 113

Género: Ficção

PVP: 17,80 €

Autor