Os Lugares

Fernando Gandra

Filósofo e poeta arredado, voluntariamente, das “praças literárias”, Fernando Gandra pratica uma espécie de música na sua poesia, delicada e irónica, muitas vezes mordaz, ancorada numa leitura persistente dos maiores da poesia portuguesa, e não só. Neste Os Lugares revisita as suas “pátrias” geográficas, amorosas, afectivas; assim, por exemplo: «Não, isto não é o cais das colunas / não, aqui não há índias nem brasis para encontrar. / Não, isto aqui não é o “Ca’ d’Oro” / da longínqua e sumptuosa Veneza / que enriqueceu com as especiarias. / Aqui falamos banalmente / de sargos e de enguias. / E na maré baixa, / quando muito baixa, / de lodo.»

Excerto

EU, HEIDEGGER E AS ENGUIAS

 

No outro dia estava eu aqui
na lacustre Carrasqueira
à mesa com Heidegger
quando ele me disse diante
do porto palafítico:
estes «caminhos não levam a lado nenhum.»
A lado nenhum? fiz-me eu
surpreendido.
E as enguias?
Heidegger não percebia nada
de enguias.
Continuava embaraçado na relação
entre «o ser e o tempo».

Por isso tinha a tensão alta
e lhe disseram que devia evitar
o sal, não ficar muito tempo
no concelho de Alcácer.
Digo-lhe eu: olha, Martin,
diz-se há séculos que contra factos
não há argumentos.
Então para que servem os argumentos?
para autorizarem os factos?
Vamos ao ensopado de enguias.
Heidegger foi-se embora
sem desautorizar as enguias.

 

Nota de leitura

Ficha Técnica

ISBN: 978-989-8592-56-9

Dimensões: 11×15

Nº páginas: 44

Ano: 2015

Nº Edição: 53

Género: Poesia

PVP: 10 €

 

 

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