Obras I: FESTA PÚBLICA | ORLANDO EM TRÍPTICO E AVENTURAS | RAINHAS CLÁUDIAS AO DOMINGO

Virgílio Martinho

Apresentação de Luís Miguel Rosa

Nota biográfica e Notícia bibliográfica de Carlos Alberto Machado

 

«A característica que mais me impressionou a ler este volume, a que me parece tão moderna, é a ideia da ficção como performance em vez de relato realista, como se ela estivesse a tentar regressar aos antigos dias dos rapsodos. No clima festivo de Festa Pública, o pólen do sexo no ar, o mestre de cerimónias da Organização Internacional de Espectáculos Emocionantes inicia um show: “Temos a honra de servir honestamente o vosso optimismo, a vossa justa curiosidade, o vosso direito de diversão, para tanto é nosso costume obrar prodígios.”

(…)

A performance prossegue em Orlando: no conto circense “Alegre Folião” as acrobacias dos trapezistas Alegre Folião e Lucrécia intercalam-se com o drama duma menina burguesa, Raimunda, que se tenta suicidar saltando do camarote, salvando-se pelas saias enfunadas.

(…)

Além disso, Martinho sabia que a performance é uma componente da cerimónia, a qual é intrínseca às ditaduras. Em “Morto Glorioso” é realizado o funeral dum chefe de estado: “O Glorioso Governador Morto da Cidade estava exposto às homenagens públicas.” As exéquias ficam a cargo de D. Paio, “o magnífico castelhano, que tudo previra e montara segundo o protocolo e os usos tradicionais.” As ditaduras são produtoras de ficções, e uma das poucas utilidades da ficção é ensinar-nos a localizá-las e a desconfiar delas.

Assim sendo, muitos contos em Orlando apresentam o conflito entre o indivíduo e a ordem vigente, geralmente por transgressões de política sexual.

(…) Este romantismo só soçobra em Rainhas Cláudias ao Domingo, um quadro terso duma relação entre Sofia, a “pegazita”, e Virgílio, um cliente, num sisudo registo de transacção: “Depois a pergunta, a vital: tens uma cama? O Virgílio ganhou, embora Sofia lhe respondesse oficinalmente: tenho, mas primeiro passa pra cá a massa.” Mas até neste conto, uma obra-prima de esqualidez terra-a-terra, o mais realista do volume e o mais emotivo pela volta que toma o encontro entre ambos, se ouve a performance, o aparte do narrador dirigido ao leitor: “E o Virgílio tremia, ele, o macho, tremia. Rouco e percorrido de certa moleza como vossas excelências quando vão prá cama com a vossa querida.”»

[Luís Miguel Rosa, da “Apresentação”]

Excerto

A cerimónia teve início na bifurcação. Há festa e uma taberna; uma tabacaria onde se vendem últimas notícias e punhais entrelaçados para os amorosos. Um pregão de ensurdecer, uma mulher que vende peixe numa canastra de oiro. Há o sol. A sombra dos prédios a quarenta e cinco graus e as janelas escancaradas. As colchas vermelhas e azuis, os cabelos das raparigas em relevo nas colchas. Há a sombra.

[festa pública]

Nota de leitura

Ficha Técnica

ISBN: 978-989-9007-41-3

Dimensões: 14x22cm

Nº páginas: 160

Ano: 2021 | Novembro

Edição: # 243

Género: Ficções

Colecção: OBRAS DE VIRGÍLIO MARTINHO # 001

PVP: 17 €

Autor